O pior da vergonha é acreditarmos que somos os únicos a experimentá-la.
«O meu pai quis matar a minha mãe num domingo de junho, ao começo da tarde.» É com esta frase que Annie Ernaux inicia a história de uma menina de doze anos, agora mulher, escritora e bem-sucedida, defronte dos ecos de uma recordação que marcaria para ela o fim da infância. Valendo-se da voz cativante da melhor literatura e do olhar analítico das ciências sociais, Annie Ernaux parte de vestígios concretos daquela época, fotografias, canções, livros e revistas, para convocar as sensações, os medos e anseios escondidos de uma jovem a quem ensinaram, acima de tudo, a evitar o que é malvisto. Esta é uma reflexão possante sobre o poder da memória e a forma como um só evento é capaz de alterar a consciência que se tem de si e do seu meio social. «A vergonha transformou-se, para mim, num modo de vida. No limite, já nem me apercebia dela, fazia parte do meu próprio corpo.»
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