«Micromegas é um bom resumo da postura filosófica de Voltaire e talvez um dos manifestos mais claros e desenvoltos do seu pluralismo céptico. No universo de Voltaire existem poucas constantes, e todas elas são existenciais: a estupidez ou a insatisfação, por exemplo. Um ignorante é sempre aquele que julga saber tudo, e um sábio é sempre aquele que aceita ser surpreendido e que compreende que nunca chegará a deter, conhecer ou comunicar quase nada da incomensurável riqueza que nos rodeia. Perante esta radical diversidade e superabundância do real, todos os textos, escritos ou a escrever, são impotentes.
É por isso que escrever pouco foi, para Voltaire, uma maneira de dizer mais. É a chave deste paradoxo contido nos próprios jogos de escala do conto: recorde-se que o seu protagonista não é apenas enorme (megas), mas simultaneamente minúsculo (micro/megas), ou melhor, não é na realidade nem pequeno nem grande – só é uma coisa e outra a partir do ponto de vista de quem olha. Da mesma forma, qualquer tema por mais vasto que seja pode (e deve, como Micromegas lembra ao saturniano quando exige ser instruído) ser contido em pouco discurso, numa espécie de trabalho de miniaturização intelectual. Corajosamente levado até ao fim: no seu final, Micromegas transforma-se mesmo num livro sobre tudo.»
Rui Tavares, Posfácio
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